sábado, 27 de outubro de 2012

A MISSÃO DE VITOR GASPAR

     Há algum tempo que ando intrigado com o que se passa com o ministro Vitor Gaspar. Acredito que é um homem inteligente, com uma óptima preparação académica na área da economia e com provas dadas numa bem sucedida carreira profissional em cargos de elevada responsabilidade. Tudo isso torna, a meu ver, ainda mais estranho o que se tem vindo a passar.

   Já toda a gente percebeu que quem manda de facto no governo é o ministro das finanças. Tem o primeiro ministro no bolso. E até se podia perceber que tivesse algum ascendente sobre ele, num governo confrontado com a maior crise financeira desde o 25 de Abril, com a auréola de grande figura na área da economia, pela maior idade, e pela certamente inferior preparação académica que tem o primeiro ministro em relação à sua. Mas tem que haver mais que isso. Vitor Gaspar já falhou, aliás, redondamente em quase todas as previsões em relação ao ano corrente. Alguma da sua credibilidade ficou abalada. E ninguém acredita minimamente nas previsões para 2013. Para mim, o desemprego daqui a um ano estará nos 20%, o PIB em -3%, a dívida pública em 130% do PIB e antes disso teremos a confusão instalada. Ele, como homem inteligente que é, acredita mesmo na sua estratégia? Não creio. Então porquê esta obstinação em conduzir o país para o desastre mesmo assim? Já nos disse que não há alternativa. Que esta é a única via para o regresso aos mercados em Setembro de 2013. Acredita ele que depois do desastre consumado alguém virá em nosso socorro? Também não creio.

       O que eu acho é que Vitor Gaspar é uma lança do BCE no governo e em Portugal. É um alto funcionário do banco e veio no pacote que a troika negociou com Portugal. Por isso é intocável e tudo passa por ele. Está a cumprir à risca um guião que lhe foi dado pelo BCE e não se afasta um milímetro dele. Gaspar não é remodelável porque, creio eu, foi imposto ao primeiro ministro. Só sairá se o governo cair entretanto ou depois de findo o programa de ajustamento. Mas as coisas vão correr mal. E não se pode dizer que não há alternativa sem primeiro tentar renegociar as condições do programa. Não é normal ignorar-se todos os sinais de abertura dados pelo FMI e até (pasme-se) pelo próprio BCE, sem tentar aproveitá-las a nosso favor. Já há 3 anos que escrevi que nós não conseguiremos pagar a dívida sem uma reestruturação com hair-cut. O montante pago em juros cresce anualmente, ao mesmo tempo que decresce o PIB. Se eu estivesse agora no 9º ano já percebia que não é possível pagar esta dívida com juros ao nível da usura. E este peso do serviço da dívida está a matar o crescimento e vai arrasar a economia do país. Infelizmente penso que é essa a missão de Vitor Gaspar. Que paguemos 8 mil milhões de euros de juros anualmente, caladinhos e com bom comportamento. Os credores há muito que sabem que não vamos conseguir pagar, portanto quanto mais juros pagarmos agora menos eles perderão daqui a algum tempo. E se o problema é o regresso aos mercados, alterem os tratados e permitam ao BCE financiar directamente os países, comprando-lhes dívida no mercado primário com taxas de juro por exemplo de 2% acima da taxa da dívida alemã.

     É isto que eu acho de Vitor Gaspar. Mas as coisas vão correr mal em 2013. Quando estalar o impacto do aumento do IRS nos recibos de ordenado, veremos. E se o caldo entornar, Gaspar voltará para o seu lugar dourado no BCE enquanto por cá se abrirá concurso para ver se alguém se habilita a tentar apanhar os cacos em que estará transformada a economia portuguesa...

1 comentário:

  1. Tanta, tanta sapiência, meu Deus!
    Vê-se (lê-se) mesmo que te andas a fazer à política.
    Melhor: tás aqui tás em ministro !

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