Há dois dias, numa sucessão trágica de acontecimentos funestos nos últimos tempos nos Açores, em consequência de mais umas chuvas devastadoras, um deslizamento de terras provocou a morte de três pessoas. Numa casa foi encontrado o corpo soterrado de um homem, abraçado à sua filha, protegendo-a com o seu corpo, o que permitiu à criança escapar com vida. A notícia, dada no decorrer do relato da tragédia, deve ter sensibilizado algumas almas mais piedosas, mas não mais que isso. Já ninguém fala no assunto, que caiu no esquecimento. Tamanho acto de abnegação, heroísmo e sobretudo de amor, sim, o supremo acto de amor, que é dar a vida por um filho, passou nos noticiários, como se estivesse a dar a cotação do petróleo para o dia. É isto, o moderno jornalismo, o mediatismo de pacotilha que nos é posto à disposição diariamente. Se fosse alguma moçoila de curvas generosas e neurónios com nanismo a debitar umas asneiras com algum troglodita dos tempos modernos, deitados num sofá, teria tempo de antena reservado para uma noite e um "share" de 30%. Se fosse alguém que tivesse ganho uma corrida qualquer, as televisões estariam a fazer reportagem em casa da família, a mostrar como vive, o que faz, o que come, quem é a família, em que casa de banho faz chi-chi. Mas quem quer saber da história de um pai que morreu soterrado salvando a sua filha? Quem era? O que fazia? Como vivia? Alguém se interessa por isso?
Que mundo este em que vivemos, com os valores todos invertidos. E a comunicação social, com a tremenda influência que tem sobre as pessoas tem por isso uma enorme responsabilidade nessa tendência que se acentua. Mas como pedir diferente, se também neste sector campeia a incompetência e a mediocridade que nos é servida em doses cavalares diariamente? De facto, não há nada nem sector que escape à verdadeira crise que nos submerge.
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